Embora a preocupação com a saúde mental dos profissionais seja uma pauta presente no contexto organizacional, ainda há muito a avançar nesse quesito. Afinal, dadas as evoluções nas estratégias de mercado e tecnologias, vivemos em tempos acelerados, em que a necessidade por velocidade nos processos acaba por reger as demandas e, como consequência, causa impactos no fluxo de trabalho dos colaboradores. 

Para algumas empresas, isso pode significar rotinas estressantes, prazos de entrega mais curtos, cobranças constantes e exageradas, pressão e culto a uma produtividade quase desumana. Caso a organização não administre essas questões de forma efetiva, com boas práticas e a partir de um modelo eficiente de gestão de pessoas, a perda do prazer, da satisfação e da motivação pelo Capital Humano pode ser apenas uma questão de tempo. 

Nesse contexto, os sinais de desequilíbrio na saúde mental logo se tornam evidentes. Doenças psicossomáticas, como a ansiedade e a síndrome de burnout, já são amplamente relacionadas a desequilíbrios no ambiente de trabalho. Isso sem falar dos impactos negativos na autoestima e na autoconfiança, que podem acabar acarretando dificuldades, por parte do profissional, em reconhecer o próprio potencial. 

Esse é o ponto inicial da síndrome do impostor, um distúrbio descrito pela primeira vez em 1978 pelas psicólogas norte-americanas Pauline Clance e Suzanne Imes, e que vem se tornando cada vez mais discutido no meio corporativo. E, por isso, é o assunto do nosso artigo de hoje. Boa leitura! 

 

O que é a síndrome do impostor?

A síndrome do impostor é um distúrbio marcado, principalmente, por um misto de sentimentos negativos vivenciados por uma pessoa em relação ao seu desempenho, normalmente em contextos que envolvem o trabalho. Entre eles, estão a sensação constante de fraude, de não estar à altura do cargo que ocupa e a incapacidade de reconhecer suas próprias conquistas, esforços e competências. 

Embora ela ainda não seja reconhecida oficialmente pela Organização Mundial de Saúde como um transtorno psicológico, essa é uma condição que vem se popularizando e ganhando espaço nas discussões a respeito de saúde mental. De acordo com uma pesquisa realizada na Universidade Dominicana da Califórnia, 70% das pessoas inseridas em ambientes de trabalho vivenciam os sintomas da síndrome do impostor e, segundo essa reportagem da revista Veja, as mulheres são particularmente suscetíveis ao distúrbio. 

Pessoas com síndrome do impostor comumente apresentam sintomas relacionados à falta de autoestima, perfeccionismo, insegurança, complexo de inferioridade e até preocupação excessiva com a ideia de serem vistas como “fraudes” no ambiente de trabalho. Para elas, suas conquistas, habilidades e realizações são facilmente atribuídas ao acaso, à sorte, ao destino, ao divino ou a qualquer outro fator subjetivo, mas nunca ao fato de serem profissionais extremamente competentes

Muito pelo contrário, até. É comum que esses colaboradores, além de incompetentes e insuficientes, se enxerguem como profissionais medíocres, que não fazem nada mais do que mínimo esperado – ainda que seus resultados mostrem exatamente o contrário. Para um indivíduo com essa condição, existe sempre uma sensação de falsidade intelectual, uma autopercepção distorcida a respeito da própria performance. Essas pessoas nunca se sentem responsáveis pelos próprios acertos; em contrapartida, se culpam com veemência pelos erros cometidos. 

O efeito Dunning-Kruger

O efeito Dunning-Kruger é um fenômeno descrito pela primeira vez em um estudo no ano de 1999 pelos professores de psicologia David Dunning e Justin Kruger, e tem uma premissa diretamente relacionada aos sintomas da síndrome do impostor. A ideia do estudo pode parecer contraditória, mas, depois de uma série de testes realizados em voluntários, a dupla de professores chegou à seguinte conclusão: quanto mais um indivíduo conhece determinado assunto, menos ele se enxerga como um especialista. E o contrário também acontece: quando menos uma pessoa sabe sobre um assunto, mais acredita saber e mais superestima o próprio conhecimento.  

Esse aparente paradoxo tem um motivo bem simples: quando uma pessoa conhece profundamente um assunto, ela se torna capaz de dimensionar a grandeza do tópico. Ela entende onde se situa o seu conhecimento e reconhece o que ainda há a aprender, o que pode fazer, inclusive, que ela subestime suas próprias capacidades no assunto. Em longo prazo e de forma desequilibrada, essa sensação pode acabar contribuindo para a concretização da síndrome do impostor. 

Em contrapartida, quando alguém não possui conhecimento aprofundado sobre um determinado assunto, é muito mais fácil se sentir confiante e se enxergar como um especialista. Isso porque, ao ter contato superficial, a pessoa não consegue dimensionar a complexidade do tema, tampouco reconhecer a própria ignorância. Nesse caso, o contrário da síndrome do impostor acontece: os profissionais, ainda aprendizes em determinados tópicos, se enxergam como especialistas extremamente competentes. 

Efeito Dunning-KrugerClique na imagem para assistir ao vídeo no YouTube

A premissa do efeito Dunning-Kruger é interessante para discutir por que tantos profissionais têm dificuldades em reconhecer a verdadeira extensão de seus conhecimentos – tanto para mais, quanto para menos. A partir dela, é possível identificar uma tendência cognitiva do ser humano que se estende para além de discussões como ego, caráter, comportamento e até mesmo saúde mental. Para os professores, todos nós sofremos com o efeito Dunning-Kruger em algum nível, afinal, não podemos ser especialistas em tudo, tampouco completamente leigos. 

 

As características da síndrome do impostor 

Por conta dos moldes competitivos da sociedade, onde todos precisam mostrar não apenas que são os melhores no que fazem, como também são capazes de realizar simultaneamente várias atividades distintas e no mesmo padrão de excelência, a síndrome do impostor tornou-se uma “ameaça” a praticamente qualquer profissional. Normalmente, os primeiros sintomas se manifestam a partir de discursos autodepreciativos, em que a pessoa afetada deixa claro que não reconhece seu potencial e nem se sente digna de exercer determinada função. Conforme a síndrome se desenvolve, outros problemas surgem, como:

Medo irracional de exposição

Uma pessoa com síndrome do impostor se enxerga como uma fraude prestes a ser descoberta. Por conta disso, qualquer situação em que esteja exposta é particularmente estressante, podendo levá-la ao estado de pânico. Por isso, os profissionais que sofrem com essa condição preferem adotar uma conduta discreta e evitam situações em que possam se sentir julgados ou avaliados. É comum, também, que essas pessoas relutem em dividir suas apreensões, já que têm medo de que outros colaboradores concordem com sua ideia de que são profissionais incompetentes. 

Trabalho em excesso

Como as pessoas que sofrem com a síndrome se entendem como desqualificadas, elas têm uma tendência a trabalhar em demasia a fim de compensar a falta de compromisso que, obviamente, não é real. Todavia, vale ressaltar que essa não é uma questão de ser um workaholic, mas, sim, de estar obcecado pela ideia de obter resultados que justifiquem o próprio sucesso. Obviamente, essa perspectiva não é nada saudável e impacta negativamente a qualidade de vida do profissional. 

Perfeccionismo exacerbado

Pessoas que sofrem com a síndrome do impostor têm dificuldades em entender os erros como parte do próprio processo de amadurecimento profissional e desenvolvimento da carreira. Afinal, elas têm medo de que os deslizes acabem por expô-las como as fraudes que acreditam ser. Por isso, esses profissionais podem ficar particularmente ansiosos e estressados quando cometem erros, mesmo que sejam mínimos. A tendência é que sejam extremamente perfeccionistas com a própria produção. 

Autossabotagem

Aos olhos de quem sofre com essa síndrome, o fracasso é só uma questão de tempo. Por isso, esses supostos impostores estão sempre em processos de autossabotagem, seja através da perspectiva autodepreciativa ou deixando de lado as oportunidades oferecidas simplesmente por não se considerarem capazes de sucederem. 

Procrastinação 

A procrastinação está diretamente relacionada ao perfeccionismo dessas pessoas. Isso porque o principal motivo para que não comecem logo suas tarefas, atividades ou compromissos é o medo que têm de que os resultados não sejam satisfatórios. Além disso, há uma preocupação especial com as críticas vindas dos colegas e gestores. 

Medo de desafios 

Pessoas com esse distúrbio costumam evitar os desafios. Afinal, elas têm uma série de inseguranças, que se acentuam ainda mais em um contexto de novas oportunidades. Elas podem se sentir expostas, com medo de cometer erros, de serem criticadas, além de, comumente, não acharem que suas habilidades e competências são suficientemente boas para que consigam alcançar bons resultados em circunstâncias diferentes das habituais.  

Dificuldade em lidar com elogios e críticas construtivas

Outra característica marcante desta condição é a dificuldade em aceitar elogios e críticas construtivas. Os supostos impostores não acreditam nos elogios feitos; comumente, eles agradecem e respondem com comentários autodepreciativos. Quanto às críticas, a desconfiança também é grande, visto que esses profissionais dificilmente enxergam as boas contribuições que fazem.  

 

Impactos e problemas decorrentes da síndrome

A síndrome do impostor é uma condição que afeta pessoas para além do contexto profissional de suas vidas. Isso porque os sintomas geram impactos tanto em relação ao âmbito psicológico quanto ao fluxo de trabalho de quem vivencia. A insegurança, por exemplo, pode acabar afetando os relacionamentos, fazendo com que o indivíduo se subestime. Em casos mais graves, ela pode fazer com que ele comprometa a própria produtividade e afete sua equipe como um todo. 

O desenvolvimento dessa síndrome pode fazer com que um profissional perca oportunidades importantes para a sua carreira. Afinal, como já mencionado, além de contestar as próprias habilidades o tempo todo, esses indivíduos se sentem desconfortáveis com a ideia de mais exposição, algo comum em cargos mais altos. Esse pode ser um fator determinante para que recusem a oportunidade, mesmo que saibam dos benefícios. 

A produtividade também fica comprometida nesse cenário. Afinal, o perfeccionismo exagerado pode ser um problema para que essas pessoas finalizem suas tarefas, já que tendem a pensar que nunca estão boas o suficiente. Isso faz com que o colaborador se sinta ansioso ao ver as demandas se acumulando e, logo, cria-se uma bola de neve capaz de atrapalhar o fluxo de um setor inteiro. 

Outro consequência comum para quem sofre com a síndrome do impostor é o gasto de energia acima da média. Evidentemente, nesse ritmo, o profissional se esforça mais do que é saudável, se frustra com mais facilidade e se sente pressionado o tempo inteiro, além de gastar ainda mais energia com as preocupações irreais. Também é comum que essas pessoas se sintam constantemente insatisfeitas com os próprios resultados, o que ajuda a criar uma sensação de esgotamento mental. Em longo prazo, esses profissionais ficam sobrecarregados, a motivação é abalada, a felicidade se perde e, em casos mais graves, é possível desenvolver doenças de ordem psicossomática, como a depressão, a ansiedade e a síndrome de burnout

Para as empresas, esse cenário também não é bom. Afinal, elas deixam de desenvolver os talentos, que poderiam ser excelentes em outros cargos; têm perdas expressivas em termos de produtividade e lucratividade, além de estarem sujeitas a pedidos repentinos de demissão, o que ocasiona alta na taxa de turnover. 

 

O papel da Gestão de Pessoas nesse cenário

A síndrome do impostor não é algo que desaparece da noite para o dia. Para ajudar os profissionais que sofrem com essa condição, é preciso que a área de Recursos Humanos e a gestão de pessoas encontrem formas de tornar o ambiente organizacional mais saudável. Prevenir a síndrome é uma tarefa que deve ser feita continuamente e a partir da implementação de medidas focadas em médio e longo prazo, como ações de conscientização, de engajamento e incentivo, que ajudem o Capital Humano a manter a saúde mental em dia.

Um bom ponto de partida para criar um ambiente que colabore com a qualidade de vida dos profissionais é utilizar uma gestão humanizada, que os trate como pessoas – não como máquinas de trabalhar. Além disso, é importante que o RH conte com profissionais com soft skills diferenciadas, como empatia e inteligência emocional, para que seja possível identificar os sinais e ajudar os colaboradores afetados o quanto antes. A conduta da gestão e da liderança também impacta, tanto positiva quanto negativamente, no desenvolvimento da síndrome. Para evitar condições propícias à doença, é importante evitar comparações, não pressionar os profissionais, incentivá-los e oferecer feedbacks constantes sobre o seu desempenho. 

Além de programas de coaching e mentoria, benefícios, como suporte psicológico, são extremamente efetivos nesses casos. Essa é uma forma da gestão garantir que, em casos de doenças de natureza mental, os colaboradores tenham assistência e apoio para lidar com a situação da melhor forma possível. 

Por fim, outra forma eficaz de lidar com a síndrome do impostor é incentivando o desenvolvimento do autoconhecimento por parte do Capital Humano. Isso porque essa é uma habilidade capaz de tornar uma pessoa mais apta a lidar com as próprias questões, o que é essencial para que compreenda o próprio comportamento, a forma com que sente e manifesta suas emoções. Profissionais que desenvolvem o autoconhecimento passam a se entender melhor e, a partir da ciência de suas próprias habilidades, forças, fraquezas e limites, conseguem construir um fluxo de trabalho mais saudável. 

Aprender a reconhecer a própria capacidade é fundamental para que um profissional com síndrome do impostor supere a condição, o que pode ser feito, também, a partir do desenvolvimento do autoconhecimento. Esse é o propósito das Devolutivas Comportamentais, sessões de mentoria que podem ser realizadas de forma individual ou em grupos, em que um consultor especializado fornece informações detalhadas sobre as competências comportamentais de uma pessoa. 

De posse desse conhecimento, o profissional pode utilizar as informações para alcançar a alta performance, melhorar a relação consigo mesmo e, se for o caso, até para lidar melhor com o distúrbio. Em conjunto com o MyEtalent, nosso programa de coaching on-line voltado para transformação pessoal, autoconhecimento e autodesenvolvimento, é possível construir uma visão mais clara, positiva e assertiva sobre si mesmo, o que é essencial na jornada de superação da síndrome. 

 

10 dicas para evitar a síndrome do impostor 

Como mencionamos, a síndrome do impostor pode ser extremamente prejudicial, tanto para os colaboradores quanto para as organizações onde trabalham. Por isso, separamos algumas dicas importantes para evitar essa condição. 

  1. Procure tratamento psicológico ao manifestar os sintomas; 
  2. Estabeleça uma pessoa de confiança para avaliar de forma sincera o trabalho feito;
  3. Evite comparações com os demais colaboradores;
  4. Procure dizer a si mesmo que você irá aprender o que não sabe ao longo do tempo, ao invés de se sentir culpado por isso;
  5. Fale sobre os próprios sentimentos;
  6. Faça listas positivas sobre si mesmo, destacando habilidades, acertos e realizações;
  7. Estreite laços com as pessoas de quem você gosta e peça feedbacks constantes; 
  8. Aprenda a lidar com os erros e a entender que eles fazem parte do processo de aprendizagem e desenvolvimento profissional;
  9. Procure ser gentil consigo mesmo, aceitando elogios e evitando comentários autodepreciativos;
  10. Evite o isolamento e a autoexclusão. 

Toda e qualquer organização é formada por pessoas. Mantê-las saudáveis, felizes e satisfeitas em suas funções é uma medida essencial para alavancar a sua produtividade. Por isso, empresas que desejam manter a competitividade devem encontrar formas de garantir o bem-estar e a qualidade de vida de seu Capital Humano. Oferecer suporte para lidar com doenças como o burnout, a ansiedade, a depressão e a síndrome do impostor é o primeiro passo para tornar o ambiente de trabalho humanizado e fazer com que os colaboradores se sintam valorizados em suas atividades. 

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Fernanda Misailidis

Fernanda Misailidis é jornalista e atua como Assessora de imprensa e Embaixadora da ETALENT. Carioca, é apaixonada por artes, ama estar nos palcos e não vive sem teatro.

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